Origens do desenho urbano da cidade
Depoimento escrito em 1970, por José Maria de Amorim, primeiro tabelião da cidade de Erechim, que lá viveu desde 1924, até a data de seu falecimento em 12 de dezembro de 1978. Narra aspectos sobre o desenho da cidade, sua origem e percalços, ainda não registrados na história oficial do município.
Erechim foi criada no dia 30 de abril de 1918, por decreto do então Presidente do estado Doutor Antonio Augusto Borges de Medeiros. Depois de formalizados todas as diligências oficiais referentes ao ato de criação, o Secretário de Obras Públicas C. Torres Gonçalves ordenou a execução a divisão geodésica da cidade que serviria de sede ao novel município pelos engenheiros e agrimensores da Comissão de Terras, que funcionava no antigo povoado Erechim (hoje Getúlio Vargas). Tomaram, então, como ponto de partida a Estação Ferroviária, sem contudo ter feito, ao que tudo indica, o reconhecimento prévio do terreno.
O desenho repetiu a planta da cidade de Belo Horizonte, capital do Estado de Minas Gerais, também fora inspirado em conceitos urbanísticos usados nos traçados de Washington (1791) e Paris (1850). Aprovado o futuro traçado, iniciou-se de pronto a implantação da cidade com a venda de terrenos e respectivas construções de madeira, surgindo tudo com uma rapidez inédita, principalmente a Avenida José Bonifácio, hoje denominada Maurício Cardoso. E, assim, como que por encanto, surgiu a Vila Boa Vista, substituindo a antiga Paiol Grande.
Passado alguns anos, diante de notícias do florescente progresso da região, Torres Gonçalves veio visitar a vila, esperando encontrá-la situada sobre terreno plano e de fácil transposição, com ruas planas, com seus terminais triangulares perfeitamente niveladas. Porém, quando lá chegou e a percorreu a bordo de um automóvel Ford 1929, que roncava furiosamente nas subidas íngremes das ruas, alarmou-se. Não era o esperado.
Com o correr do tempo, foi nivelada a canhada existente na avenida Maurício Cardoso, canalizadas as sangas existentes nas primeiras quadras das ruas Itália e Nelson Ehlers, e muitos outros buracos foram mais ou menos nivelados com madeira e terra.
Em visita a mim (o tabelião José Maria Henriques de Amorim), confessou que Erechim era o seu maior pecado, pois nunca pensara que a cidade fora implantada sobre buracos. E cada vez que lá retornou e visitou o tabelião Amorim dizendo logo na chegada "Meus amigos, vim ver meu pecado". Essa era a forma como chamava Erechim: "meu pecado". E tinha razão. Mais tarde foram feitos grandes estudos para ver se era possível melhorar a situação geográfica da cidade, porém todas sem resultado. O último trabalho executado pela antiga Comissão de Terras foi um levantamento que durou muitos meses, capitaneado por Diumer Schneider, os Irmão Malinowski, os Irmãos Losina, Antônio Bergmann e Henrique Schwerin, que fizeram um levantamento topográfico de dois em dois metros quadrados, tal a situação. Antes mesmo do término desse serviço, um prefeito da época mandou o agrimensor da Prefeitura nivelar o calçamento e foram estendidos os cordões, com todos os defeitos da superfície.
E assim foi seguindo a cidade, em que muitas administrações tentaram em vão nivelar a cidade. Mais tarde desenhou-se o Plano Diretor que dispunha sobre a construção urbana. Com ele, concedeu-se o nivelamento de muitas construções antes de fazer o nivelamento das ruas, o que resultou em casas com muitos andares enterrados, depois de a rua ser nivelada como devia, para atenuar as íngremes subidas. Como não é difícil de adivinhar, houve uma grande celeuma na cidade sobre esse plano diretor, que acabou arquivado.